O capitalismo destrói o mar e os pescadores
O capitalismo é um sistema económico maligno. Evoluiu para permitir que todos nós sejamos dominados por um pequeno grupo de privilegiados. Mas, ao contrário do feudalismo que o precedeu, tem uma característica que nos está a pôr uns contra os outros e a destruir o planeta que conhecemos: para se manter, precisa de crescer continuamente e de forma exponencial, explorando sem piedade quer as pessoas quer a natureza. Tudo isto pode ser ilustrado pela presente discussão sobre o impacto das áreas marinhas protegidas (AMP) sobre os pescadores.
Primeiro uma definição: o capitalismo não tem a ver com mercados nem com comércio livre, definindo-se antes pelos seguintes 3 pilares. (1) Os meios de produção (as fábricas, as máquinas, o financiamento, enfim, o capital) estão nas mãos de uma elite económica, os patrões. (2) A produção tem como objetivo o lucro e não a satisfação das necessidades das pessoas. O lucro é o dinheiro que fica depois de pagar todas as despesas. Para que haja lucro ano após ano a economia tem de crescer continuamente. (3) A grande maioria das pessoas, sem recursos, tem de vender a única coisa que possui, a sua força de trabalho. Por esta definição se percebe que o capitalismo está baseado numa desigualdade fundamental: os empregados são explorados porque o seu trabalho produz mais valor do que aquele que recebem como salário. A diferença é convertida em lucro para o patrão.
Vejamos agora o efeito do capitalismo na pesca. Como sabemos, os pescadores trabalham sob condições duras e perigosas para capturar o peixe que acaba nos nossos pratos. Mas do dinheiro que pagamos pelo peixe só uma parte minúscula fica nos bolsos dos pescadores, ou de quem de facto trabalha para conservar, transportar e amanhar o peixe. Ao longo de toda a chamada “cadeia de valor” (compradores, revendedores, distribuidores, retalhistas, hotelaria) a lógica capitalista impera. Ao fim do ano, depois de pagar todas as despesas, cada empresa tem que ter mais dinheiro do que aquele com que começou, para poder passar o lucro para os investidores. Atenção: isto não se aplica às pequenas empresas: os pequenos armadores, a carrinha que leva o peixe pelas freguesias, a lojinha da esquina… essas não dão lucro. Mas as grandes empresas, nomeadamente os hipermercados e os bancos, geram lucros colossais- pela exploração de todos os outros. Que o valor gerado pelo trabalho dos pescadores seja aspirado para os bolsos de “investidores”, em vez de lhes permitir ter uma casa em condições ou enviar os filhos para estudar, não é um erro: o sistema capitalista está desenhado assim! Cada empresa quer reduzir custos (contratar o menos possível, pagar a cada trabalhador o menos possível, vender o mais caro possível) para aumentar os lucros. E os bancos exploram todas as empresas.
Esmagados no fundo da cadeia, aos pescadores só resta uma solução- pescar mais: mais horas no mar, mais longe, mais fundo, mais redes, mais anzóis. Eles sabem que isso é mau e não é sustentável, mas não veem alternativa. Por isso, também, se compreende que reajam agressivamente quando a mesma sociedade que não lhes paga o trabalho de forma digna lhes vem impor limites ao que podem pescar. Mas, como vimos, o problema vem do capitalismo, não das áreas marinhas protegidas. E portanto a solução tem que vir, não de pescar em todo o lado tudo o que se quiser, mas de descartar o capitalismo por um sistema melhor.